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REENCONTRANDO A FELICIDADE

Um dia de cada vez.


Oito meses após o atropelamento de seu único filho, Becca e Howie procuram viver a vida da melhor maneira possível, com cada um lidando com a dor e a saudade à sua maneira. Howie gosta de frequentar um grupo de apoio formado por pais na mesma situação, mas Becca não. Ele procura afeto, que a esposa não consegue dar e, para suprir sua perda, ainda mantém a cadeira do filho no carro e sempre revê o último filme do filho em seu celular. Ela prefere se isolar e se livrar dos desenhos presos na geladeira, das roupas e até mesmo da casa, para evitar reviver o filho em cada cômodo.



Depois de “surgir” chutando a porta com a adaptação de sua peça teatral off-broadway Hedwig and The Angry Inch (2001), que exalava vitalidade por todos os poros, e de “escandalizar” ao filmar uma ejaculação logo na primeira cena do melancólico Shortbus (2006), eis que John Cameron Mitchell aparece com um trabalho “intimista” e voltado a um público maior do que os seus dois trabalhos anteriores.

Entendo o quanto Reencontrando a Felicidade possa ter sido uma decepção para os indies e para a comunidade LGBT. Isso mostra limitação deles e não de John Cameron Mitchell. O tom intimista está desde o close nas mãos que pegam o adubo, passando pelo queijo derretendo do crème brulé e pelas linhas que vão formando um desenho ao longo do filme. A trilha sonora contribui, assim como a forma como a trama vai se desenrolando.

Para melhorar sua percepção do filme, sugiro que você não tente saber mais nada sobre ele, pois a história vai sendo contada aos poucos. Primeiro, você sabe que há algo de errado com aquele casal. Depois, você descobre o que foi. Mais tarde, você saberá quem, como e porque. Apenas faltando 10 minutos para o final que você verá “a cena” e só depois que Becca e Howie encararem de frente seus medos é que eles poderão, enfim, seguir em frente. Mesmo assim, com um enorme ponto de interrogação.

Não entre nessa pegadinha que o horrendo título nacional induz. O filme não é sobre a superação do luto. É, essencialmente, sobre as zonas de conforto que Howie e Becca criaram após a morte do filho, mas nada tão hermético. Num dado momento, Becca reencontra alguém (que você só descobrirá quem é uns 20 minutos depois) e cria uma nova zona de conforto. Howie, por sua vez, surta ao perder uma das suas. Depois, ele tenta achar outra, mas vê que não poderá buscar o afeto desejado onde ele pretendia.

É um filme tátil. Os personagens vão tateando. Aos poucos. Testando.


A
Rabbit Hole (John Cameron Mitchell, EUA, 2010)
Quando: Maio/11 (UCI Recife)

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